Acidentes de carro, ônibus,
trem, metrô, avião ou naturais – enchentes, incêndios, soterramentos, furacões
- assaltos, sequestros, são eventos que deixam marcas profundas – traumas - em
qualquer pessoa que, por um desses, já sofreu.
No dia 27/04 sofri um
assalto com arma de fogo pressionada na minha cabeça. Graças a D’us nada de
mais grave ocorreu comigo. Só mesmo as perdas materiais e esse estresse que
ainda vivo. Lembrei-me dessa palestra que proferi num congresso de Psicologia
Hospitalar há alguns anos. Talvez para me lembrar de
que tudo que estou sentindo faz parte de um processo e que, principalmente, passa! Também como auxílio para quem já vivenciou ou ainda esse tipo de estresse. Mas se tiver com preguiça em ler um texto um pouco mais longo ou acredita que "isso jamais vai acontecer comigo", simplesmente veja a última imagem!
Infelizmente, aqui no
Brasil, não temos ainda por parte do governo medidas adotadas para socorrer
essas vítimas. Falo de equipes especializadas na área do “socorro psicológico”
como as - há muito - existentes no exterior. Todos se lembram do acidente com o
avião da Air France ocorrido em junho/2009. O governo francês, imediatamente,
deslocou esses profissionais para o Rio de Janeiro, aonde prestaram seus
serviços aos familiares, enquanto aguardavam as buscas. O mesmo ocorreu em 2008
no Aeroporto de Madri – e sou testemunha ocular – quando de outro acidente
aéreo. E mais recentemente no soterramento dos mineiros no Chile. O
TEPT atualmente é muito estudado num movimento que tem sua maior produção nos
Estados Unidos, alguns países da Europa, Israel e Oceania. No Brasil essa
entidade clínica ainda é pouco conhecida, raramente diagnosticada e facilmente
confundida; são escassas as publicações científicas, e o tema é pouco tratado
em eventos especializados.
O Transtorno de Estresse Pós-Traumático - TEPT - é
uma condição clínica que surge após a pessoa vivenciar uma situação traumática
– aquela em que ponha em risco tanto a sua vida ou integridade física, assim
como a de pessoas afetivamente ligadas. Podem surgir diversos transtornos psiquiátricos
desde depressão, fobias (ex. medo de dirigir após acidente de carro) até o mais
comum que é o TEPT.
Tradicionalmente a
sintomatologia do TEPT é organizada em três grandes grupos: o relacionado à
reexperiência traumática, à esquiva e distanciamento emocional e à
hiperexcitabilidade psíquica.
Reexperiência
traumática
Mesmo estando o
perigo afastado e confinado ao passado, o indivíduo pós-traumatizado
continuamente revive o ocorrido, vivenciando-o como experiência contemporânea
em vez aceitá-lo como algo pertencente ao passado: "Incapaz de retomar o
curso de sua vida porquanto o trauma constantemente está a interrompê-la: é
como se o tempo parasse no momento do trauma". Quase sempre rumina
pensamentos de forma improdutiva sobre temas relacionados ao trauma. Estão
presentes as lembranças intrusivas e recorrentes: recordações que assaltam o
paciente continuamente. São lembranças fixas, que não se alteram com o tempo,
de uma nitidez e vividez distintas, além de carregadas de forte componente
afetivo e emocional: a lembrança trazendo angústia e sofrimento intensos.
Espontâneas, involuntárias, ao surgirem não são facilmente interrompidas,
parecendo "ter vida própria". Muitas vezes as lembranças estão
fragmentadas em forma de imagens, sons, odores, sensações físicas (náuseas,
tonturas e outras) ou emoções (medo, pavor, horror) não conectadas umas às
outras por força do que foi denominada dissociação primária. Com a
elaboração psíquica da experiência, essas recordações, que muitas vezes estão
guardadas em fragmentos sensoriais com pouco ou nenhum componente de linguagem,
vão se integrando e chegando, com o correr do tempo, a se constituir em
narrativa que conseguiria traduzir o ocorrido.
Esquiva e
distanciamento emocional
Os sintomas relativos
à repetição da experiência traumática são acompanhados de considerável
sofrimento, que a maioria das vítimas busca evitar, afastando-se de qualquer
estímulo que possa desencadear o ciclo das lembranças traumáticas.
Aparece, então, a
esquiva ativa de pensamentos, sentimentos, conversas, situações e atividades
associadas ao trauma como um mecanismo de defesa contra a ansiedade gerada pelo
fenômeno intrusivo.
Dessa maneira, por
provocar tamanha angústia, o indivíduo pós-traumatizado não economiza esforços
no sentido de afastar-se dela. As estratégias de esquiva podem ser óbvias ou
sutis, relativamente adaptativas ou manifestamente inadequadas que vão da
recusa em falar sobre o trauma, ao uso de bebidas alcoólicas ou drogas para
obscurecer as memórias, até ao engajamento excessivo e compulsivo em atividades
como trabalho, jogo, sexo, entre outras.
Hiperexcitabilidade
psíquica
O terceiro grupo diz
respeito àqueles sintomas que representam um estado de hiperexcitabilidade do
sistema nervoso central e autonômico e que não se resumiriam apenas a
condicionamentos a estímulos traumatogênicos, mas antes seriam reflexos de uma
excitação fisiológica extrema em resposta a uma variedade ampla de estímulos.
Trata-se dos sintomas mais comuns e também dos menos específicos: especialmente
quando em contato com estímulos-trauma afins, uma variedade de reações
acompanha o humor ansioso, como taquicardia, respiração curta ou suspirosa,
constrição precordial, "formigamentos", parestesias, sudorese,
extremidades frias ou também cefaléias, tonturas, sensação de "oco na
cabeça", "peso no estômago", entre outras. Há a insônia, e
aparece a irritabilidade e a explosividade: sempre alertas, os pacientes passam
do estímulo à ação sem o tempo para a necessária reflexão e avaliação
criteriosa do estímulo provocador.
Assim o TEPT caracteriza-se por
recordações persistentes e revivências da situação traumática causando grande
angústia e uma série de sintomas físicos o que leva a um comportamento de
esquiva – passa a evitar toda e qualquer situação que possa ativar a recordação
com ansiedade intolerável. Há também uma restrição de interesses, isolamento
social, distanciamento das pessoas além de insônia, irritabilidade,
explosividade, reações de “susto”, sobressaltos exagerados. Algumas
reações podem ser consideradas respostas normais e compreensíveis, mas a
persistência do quadro após um mês sugere o adoecimento.
Normalmente estas pessoas não procuram ajuda
especializada por acharem que o que sentem é normal frente às circunstâncias
enfrentadas, mas a persistência destes sintomas não é normal, principalmente se
existe prejuízo no funcionamento social, relacionamento interpessoal,
desempenho no trabalho.
Conclusão: Não há
como negar, todavia, que o grande mérito da introdução do TEPT, ao longo de
quase um século de debates, está em reconhecer e legitimar a condição clínica
essencialmente derivada do trauma psicológico (apesar do componente individual
e constitucional, sem o qual nenhuma reação aconteceria), sendo essa condição
não intrinsecamente temporária, admitindo-se sua perpetuação e cronicidade.
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