Vou tentar me conter para contar. Após a cirurgia, o que foi retirado de minha mama foi enviado para exame anatomopatológico. Quando me abriram, todos os amigos istas - que por acaso são meus médicos também – ficaram exultantes com o que viram. Aqui abro um parêntesis: minha experiência, num hospital geral, já havia me ensinado que, por mais modernos, atualizados que sejam os exames de imagem, somente quando se opera é que se tem a visão real seja do que for. Parêntesis fechado prossigo. Esse tempo de espera é terrível e tenho certeza que qualquer um aqui sabe do que estou falando: resposta da necessitada entrevista de emprego, exame de gravidez, vestibular, aprovação no mestrado, se está sendo correspondido (a) no amor que sente, enfim, qualquer anúncio que nos deixe em estado de graça. Não é fácil exercer, nesse momento, a tal lição da paciência e calma. As horas se transformam em dias e esses em semanas que se arrastam através de pensamentos nada positivos.
O telefone tocou interrompendo uma sessão (peço desculpas ao paciente) e a voz da secretária anuncia que o resultado chegara e agenda para aquele mesmo dia a conversa com o mastologista. Não pode me informar pelo telefone? Não! Cancelo minha agenda e sigo em frente.
Nada - nada mesmo - em minha vida já seguiu caminhos retos e fáceis. Escuto do mastologista que o resultado não fora conclusivo! Divisão na equipe de patologistas assim descrita: “Presença de alguns focos de proliferação epitelial exuberante (ah minha exuberância se manifesta até aqui!) de difícil (viram?) diagnóstico diferencial entre hiperplasia ductal atípica (tecla SAP = nada) e carcinoma ductal in situ (o melhor Ca possível! E jamais vou entender que um câncer tenha uma forma bacana, melhor de ser!!!).
Sugeriu-se então, que o “caso” (euzinha) fosse revisto por outra equipe de patologistas, já que não houve consenso diagnóstico. Minha reação? TAQUEOSPARIU!!! Nada, em tempo algum haverá de ter consenso? Facilidade? Não quero unanimidade, mas certo consenso, de vez em quando, é roupagem que agradaria.
Pego todo o material e encaminho para a outra equipe de patologistas seguindo as instruções dadas. Pois você sabe, né Regina, que cada diagnóstico desses requer uma intervenção terapêutica diferente. É mesmo? Não me diga! Não, não sei de nada... Como gostaria de, realmente, não saber nadica de nada!!!
Lá vou eu exercitar a tal da paciência e espera novamente, até o final desse mês... TAQUIOSPARIU!!! Mas, ao longo desse exercício, tomo uma decisão irrevogável que partilharei, oportunamente, com vocês.
Dez minutos antes de iniciar meus trabalhos, à noite, em mais uma quinta-feira de doação, o celular toca. Do outro lado a secretária - dos novos patologistas - avisa que a segunda opinião está sentenciada.
Desligo o telefone e me pergunto se conseguirei, nessa última quinta-feira, doar o melhor de mim. Não preciso informar - com palavras - nada para meus irmãos trabalhadores. Quando me dou conta, estou envolvida em LUZ e AMOR! Trabalho de uma maneira especial, e ouço de cada um - que recebeu a energia canalizada através de minhas mãos - um sincero obrigado e a gratidão de D’us lhe abençoe. Será que sou merecedora de ser abençoada? E todos os meus amigos, familiares, tantos amados que passaram ou estão passando , por essa estrada, não o seriam? Continuo minha conversa com ELE, de uma maneira meio brava, meio revoltada, mas logo percebo que essas respostas não as obterei. Não agora.
Sigo na manhã seguinte, bem cedo, em direção à resposta conclusiva. Sou misto de ansiedade, calma e a certeza que “já está escrito”.
Sento no meio-fio de uma das avenidas mais movimentadas para somente abrir o que já estava escrito. Olho todos os ipês exuberantemente floridos. Penso em cada amado meu que partilhou, orou, vibrou para e por mim. Lembro de Rosanes, Marias, Ângelas, Beneditas, Cristinas, Temas, Wilmas, Virnas, Graças, Salvadores, Simões, Felipes e tantos outros guerreiros. Respiro fundo mais uma vez. Leio: “Ausência de carcinoma in situ e/ou invasivo”.
Explodo em lágrimas de agradecimento. Grito, olhando para meu céu de brigadeiro, OBRIAGADA PAI! As pessoas passam por mim assustadas, penalizadas e somente uma se agacha e me envolve num abraço. Rimos sem dizer palavra sequer. Confusa penso ser um anjo de asas invisíveis que ELE me enviou! Agradeço mentalmente. Ela segue em frente e eu ligo para alguns amados para partilhar a benção.
Levanto e, em tempo, explodo na certeza que minha missão há de prosseguir. Explodo como a primavera que iniciou e a lua cheia que, mais uma vez, traz ,para bem perto, meu gato selvagem. (RR)