Lá
pela década de setenta havia uma loja masculina com esse nome: Art Man. Os
meninos – mauricinhos abonados da época – faziam suas compras por lá e exibiam,
nas baladas, o que era de mais chique. Fizeram um adesivo, desses para colar no
vidro traseiro do carro, que dizia: Viver é uma Art Man.
Venho
pensando nessa arte. E não há como desatrelá-la da angústia da morte.
Tem dias que sinto ter desaprendido. O conhecimento adquirido fica para sempre?
É cumulativo? Montaigne escreve em seu ensaio Estudar Filosofia é aprender a
morrer: dê lugar a outros, assim como outros deram lugar a você: “A utilidade
de viver consiste não no tamanho dos dias, mas no uso do tempo. Um homem pode
ter vivido muito tempo e, mesmo assim, ter vivido apenas um pouco”. Isto mostra
que somente reconhecendo os ciclos da natureza, estaremos preparados para a
vida e consequentemente para o processo da morte. Então, se compreendermos o
ciclo da natureza, onde todo ser vivo nasce, cresce, alcança a maturidade,
envelhece e morre, dando início novamente ao nascimento, nossa angústia
diminuirá sensivelmente. Será?! Todo o processo é comandado pela natureza,
mostrando que a morte é o fechamento do ciclo da vida. Portanto, podemos pensar
que a morte começa quando a vida se inicia.
No
Eclesiastes está escrito: “Para cada coisa há uma estação, e um tempo para cada
propósito sob o sol, um tempo de nascer, e um tempo de morrer”.
O
ato de deixar morrer e deixar viver é profundamente importante, pois é o ritmo
primário e natural que todo ser humano deveria compreender e vivenciar sem
temor, criando condições de planejar e objetivar o futuro mais tranquilamente e
se instrumentalizar contra os percalços da vida. O ciclo da natureza ao ser
negado revela o temor do aspecto da morte ao mesmo tempo em que produz a
devastação do próprio ambiente por não ser respeitado em seus aspectos e
ritmos. A natureza da morte foi transformada em convicção, que nos fizeram crer
estar cindida da vida. O nascer é então glorificado e o morrer um sacrifício
insuportável.
Morte
e vida não podem ser vistas como opostas, pois, além de pertencerem ao mesmo
processo, estão acontecendo ao mesmo tempo no ambiente físico e psíquico do
homem. Em culturas indígenas e orientais ela faz parte do ensino de valores de
vida, como todos os outros rituais de passagem.
Compreender
a morte traz um conceito verdadeiro da vida, do amor, da lealdade e também da
felicidade. É ir ao fundo da alma, do mundo subterrâneo, onde tudo é
transformador. Ao emergirmos de lá, nos tornamos mais sábios e capazes de
acompanhar o processo complexo que é a própria vida. No mergulho da alma,
compreendemos a natureza e ressurgimos com lições para perceber novos caminhos,
tendo a força de vida para enfrentar as fases difíceis e a paciência para
aprender a amar e respeitar a vida e a morte com profundidade sabendo que ela
faz parte do macrocosmo e que portanto fazemos parte do todo, do uno. Viver
é realmente uma Art Man! E você, é artista?
Não sou, querida Rê. Longe disso, sobretudo porque me lembro que tenho um filho pequeno para criar.
ResponderExcluirAceitar a morte e ver na vida uma dádiva não é para qualquer um. Há que crescer, espiritualmente.
Os meus avós eram unha e carne. Quando a minha avó morreu, após 16 dias de internamento com líquido nos pulmões, vi o meu avô ficar com o cabelo todo branquinho.
Nunca mais a sua gargalhada foi a mesma.
Quando ele partiu, num acidente trágico vitimado por um atropelamento de um trator de um conhecido, percebi que por mais trágica que tivesse sido a sua morte, ele tinha que ir ao encontro da sua deusa.
Já na minha vida, para encontrar essa força maior...essa arte, olho à minha volta. Nem sempre consigo, mas faço por olhar e agradecer o que possuo.:)
bji, querida
(tens um convite na tua caixa de e-email)
Regina, acabei de fazer um post a volta do que me faz ser e existir, toda essa coisa do sentir, do entender, da alegria e das lágrimas, da nossa existência etc...
ResponderExcluirtou jaburu e seu post simplifica, suaviza, apesar de eu não conseguir arrancar aquela garra ferrada no peito, você sabe....
só o amor é meu lenitivo, só !!!
beijo n.a.
Fosse o fluir do tempo mais que uma ilusão dos sentidos, não haveria essa identidade entre dois estados existenciais que só são exclusivos nessa ilusão.
ResponderExcluir"Somos a soma do que fomos e do que seremos. Somos a integral, de zero a infinito, de todos os tempos do verbo ser" (adaptado de um comentário a Lu Cavichioli).
Carregamos a vida e a morte.
Abraços.
Toda atividade humana tem como função básica livrar-se das garras da morte. É para não morrer que a gente dorme, que a gente se levanta, que a gente ama, que a gente estuda, trabalha, xinga, blasfema, reza ladainhas, faz discurso na praça, arruma um ponto de mínimo conforto nas engrenagens da sociedade e acaba por constituir um diferencial, uma persona, uma identidade única no meio de tantas criaturas semelhantes. A morte é a alavanca propulsora de toda energia vital.
ResponderExcluirin: http://www.revistabula.com/posts/colunistas/o-medo-de-morrer-nos-mata-por-antecipacao
Bjs.
Morremos um pouco a cada dia. O próprio sono é a experiência da morte, a cada noite. Só que não pensamos muito nisso. Temos tanto medo do desconhecido, que preferimos fingir que somos eternos. No entanto, a possibilidade da morte é que garante a vida - fazendo parte dela. Pois vamos viver, o melhor possível, até que ela chegue. Beijos, Angelinha
ResponderExcluirRê Amiga,
ResponderExcluirÉ bom partilhar com os amigos alguma reflexão.
O medo de morrer é uma das maiores causas das nossas perturbações interiores. No entanto quem tem menos medo de morrer tem mais possibilidadesde ser feliz. Devemos aprender a envelhecer e aprender a aceitar a "vinda da idade".
Grato e feliz pela visita ao Azimute.
Um xião.
J
Penso que compreender a morte é complicado,,,temos que aceitar a nossa unica coisa certa da vida,,,no mais,,,viver enquanto aqui estivermos....beijos querida e uma bela semana pra ti cheia de poemas e flores....
ResponderExcluirAmiga Regina
ResponderExcluirBelo post
Tive medo de morrer, e não conhecer a minha própria força....mas ele passou.
Beijos da Sol
Pensar na vida é pensar na morte; elas estão atreladas, uma não existe sem a outra. Mas enquanto estivermos presos à materialidade da vida, teremos medo de enfrentar a morte ou de falar sobre ela. A morte é certa, a vida nem sempre! Beijus,
ResponderExcluirRê irmiga, Existe um espaço entre a vida e a morte que, por vezes, é uma difícil travessia, outras vezes um descansar num mar calmo, outras uma brincadeira com as ondas do mar e, ainda outras, um passar pela vida sem ver o mar. Acontece que nem sempre, nem todos, estão dispostos e fazer de facto a travessia e enfrentar os perigos e riscos dessa viagem. Só que ela é inevitável e, por mais que alguns teimosamente persistam em não querer crescer, vão de certeza envelhecer, permanecendo crianças, rabugentas e mimadas.
ResponderExcluirPois, e também acho que a morte não é o contrário da vida, mas sim o oposto do nascimento. Há mais Vida para além da vida, mas essa só encontraremos, de facto, depois da morte. Por agora, temos mesmo que fazer a nossa parte da travessia, ainda que por momentos (que às vezes são anos ou dias) pareça que vamos naufragar.
Daqui, do outro lado do oceano estou consigo irmã siamesa querida.
Jinhos Grandes
Querida Rê,
ResponderExcluirSeu lindo texto,tão reflexivo e que todos, lá no mais íntimo de nós, pensamos um dia ou vez ou outra, principalmente quando vemos despedidas como a da simpática e amada apresentadora Hebe Camargo, uma pessoa cheia de vontade de viver, sempre antenada com tudo à sua volta. Não merecia ir assim tão cedo! Aliás, ninguém merece!
Não há como não pensarmos a respeito dessa que vem no mesmo pacote que a vida que nos foi oferecida - a morte - que para nós é tão difícil entender e aceitar, mas para alguns povos como os mexicanos, por exemplo, é vista e tratada de uma forma tão leve, tão diferente e até festiva.
O problema maior é que no mundo atual, as mortes assustam, por que morremos muito mal, geralmente atrás das portas de UTIs, sozinhos, desligados nas tomadas, mortes trágicas, de acidentes, de sustos, de repente, de doenças que temos medo até de pronunciar o nome, morremos perplexos com tudo o que ocorre tão rápido, como foi o caso de nossa amiga Glorinha, em 5 meses apenas, ela foi morrendo e deixou a mim, a você, a tantos, perplexos em como a morte chega assim, apavorante e desconcertante.
O melhor talvez seja pensar como os budistas e levar a vida, ou seja, 'A morte, não é uma questão de SE, é uma questão de QUANDO..."
Desculpe se me alonguei no comment, mas é um assunto por demais intrigante para as nossas cabeças.
um beijo carioca
Regina!!!!! Olha ADORO voce do fundo do coração! Sempre me faz sorrir!
ResponderExcluirSobre o tempo, como vive-lo, como me considero uma aprendiz da vida, tenho muito o que passar, caminhos que se convergem, se cruzam, obstaculos, iluminados.
Obs: Ahhhhhhhh To rolando de rir!
Ué?! Fadas tambem amam e são muito, mas muito sensuais!
beijos
Uma bela noite pra ti minha amiga e uma excelente quarta feira recheada de poesias e flores....beijos e beijos...
ResponderExcluirQuerida amiga
ResponderExcluirPenso que viver
é sempre saber
menos as respostas
para as nossas
próprias dúvidas.
Fique com tudo aquilo
que te acalme o coração.
Aluísio Cavalcante Jr.
Quando a humanidade finalmente compreender e aceitar a morte, o que mais resta a fazer? Viver será simplesmente deixar o tempo fluir até chegar a hora que nem será tão dolorida?
ResponderExcluirFalta-me sapiência, falta-me.
Beijo, meu bem.
Saudades de ti.
Pensar nela, a morte, é inevitável.
ResponderExcluirEngraçado que pra mim, não a temo, mas para os meus, muitíssimo...beijos,chica
Amiga,
ResponderExcluirColoquei um post que ficará apenas mais um dia e na verdade é um convite para participar de uma brincadeira no dia das crianças. Envie uma foto sua quando criança para participar da brincadeira. O email está lá no post, confira, ok.
Aguardo a tua fotinha, pode ser em preto e branco, inclusive, ok.
beijocas cariocas
Concordo com a Milene Lima*
ResponderExcluirSaber viver..."deixar fluir! Calma e "se mergulharmos na alma, compreenderemos a natureza e ressurgiremos com lições que só nos fortalece... Não penso em morte, porque pessoas queridas me esperam e deixa quieto rs
"Eu vou, mas antes tenho "muito que passar" como diz a amig acima e... *viver.
Me visita e vê se topas um desafio, eu topei ...Vê Lá!
beiju
Te desejo um fim de semana de pazzz.
Ame! ame sempre e seja feliz!
Que texto brilhante, Regina. Muitas pessoas estão mortas mesmo vivas e viver é sem dúvida uma missão nada fácil. Somos todos artistas e ás vezes estamos muito inspirados na arte, já outras... Beijos e bom fim de semana.
ResponderExcluirOs iluministas diziam que nossa função é sempre evoluir. Como? Passando nossos conhecimentos para a próxima geração porque não viveremos aqui para sempre.
ResponderExcluirNinguém viverá.
Um bom final de semana.
Saber viver: eis a questão que nos devemos colocar a todo o momento; perceber o alcance semântico, questionar e fazer da vida um processo de arte vivencional...
ResponderExcluirAdorei, como sempre, seu texto.
Bjosss :)