Não importa onde estamos, numa mesa de bar ou no divã do analista, nossa mente nunca para e nossos medos e desejos nunca nos abandonam. Nem por um instante nos separamos do que realmente somos e, por mais difícil que seja, não controlamos cem por cento nossas atitudes. Se Freud, após 40 anos de estudo da mente humana, continuou com várias dúvidas sobre o ser humano, quem sou eu ou você para julgar as “crises histéricas” da melhor amiga? Só Freud explica!?!
Coisas simples que todos vivemos,pensamos,sentimos e nem sempre conseguimos partilhar. Assuntos, temas, extraídos da minha experiência clínica e do meu cotidiano. Em alguns você pensará: tô fora... Em outros: tô dentro...

Mostrando postagens com marcador dasdô. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador dasdô. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

DASDÔ




O dia amanheceu chuvoso. Continuo dormente. Qual será meu desperta_dor? Penso nas centenas de pessoas que pulsam - nesses últimos dias e noites - dores. O estado de dor extrema, mistura de esvaziamento do eu e de contração em uma imagem-lembrança, é a expressão de uma defesa, de um estremecimento de vida. Essa dor é a última muralha contra a loucura. No registro dos sentimentos humanos, a dor psíquica é efetivamente o derradeiro afeto, a última crispação do eu desesperado, que se retrai para não naufragar no nada. Eu estava ali, desestabilizada pela impenetrável infelicidade dolorosa de centenas. As palavras me pareciam inúteis e fiquei reduzida a fazer eco aos seus gritos lancinantes. Sabia que a dor se irradia para quem escuta. Sabia que, em um primeiro momento, eu tinha apenas que ser aquela que, só por sua presença – mesmo silenciosa e distante – podia dissipar o sofrimento ao receber suas irradiações. E que essa impregnação aquém das palavras poderia, justamente, inspirar-me as palavras adequadas para expressar a dor e acalmá-la enfim. A dor só existe sobre um fundo de amor. 
"Amar os outros é a única salvação individual que conheço: ninguém estará perdido se der amor e às vezes receber amor em troca." (Clarice Lispector)

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Filhos? Melhor não tê-los! Mas...


Minha mãe quando estava muito aborrecida, decepcionada, triste mesmo com alguém, dizia: to queimada e assada. Achava estranho, mas entendia perfeitamente a expressão dita com olhos lacrimados e alma desnudada pela dor. Porque pra ficar queimada e assada, dessa maneira, qualquer proteção já foi pro beleléu. Numa conversa telefônica, a amiga referindo-se ao filho único, disse-me: hoje ele tá chato demais! Ops. Mãe dizendo da chatice de um filho?! Senti um alívio, com esse desabafo partilhado, que vocês nem imaginam. O tempo todo, todo o tempo, só ouço, leio, e vejo declarações mais que perfeitas desse amor incondicional. Como se nessa relação não houvesse desgaste, confrontos, furos, medos e outras coisinhas mais. Filhos são sim, muitas vezes, chatos. Outras tantas: egoístas, desmemoriados, ingratos, dramáticos, acusadores, cobradores e passageiros. E a gente - aqui - sendo ônibus grandão na incondicionalidade! Afff... Como falamos, minha amiga e eu, até pra ausência de condições há que se ter algum limite! O problema, o meu pelo menos, é encontrar a medida certa. Lembro-me das palavras de outra amiga, Zizi, me dizendo: “ser mulher e mãe nesta vida, indica um tremendo carma redobrado" Enquanto a gente vai errando e acertando na medida deixo, novamente, esse poema de Vinícius que a-do-ro!
Poema Enjoadinho
(Vinicius de Moraes)
Filhos...  Filhos?
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-lo?
Se não os temos
Que de consulta
Quanto silêncio
Como os queremos!
Banho de mar
Diz que é um porrete...
Cônjuge voa
Transpõe o espaço
Engole água
Fica salgada
Se iodifica
Depois, que boa
Que morenaço
Que a esposa fica!
Resultado: filho.
E então começa
A aporrinhação:
Cocô está branco
Cocô está preto
Bebe amoníaco
Comeu botão.
Filhos?  Filhos
Melhor não tê-los
Noites de insônia
Cãs prematuras
Prantos convulsos
Meu Deus, salvai-o!
Filhos são o demo
Melhor não tê-los...
Mas se não os temos
Como sabê-los?
Como saber
Que macieza
Nos seus cabelos
Que cheiro morno
Na sua carne
Que gosto doce
Na sua boca!
Chupam gilete
Bebem shampoo
Ateiam fogo
No quarteirão
Porém, que coisa
Que coisa louca
Que coisa linda
Que os filhos são!

  Extraído do livro "Antologia Poética", Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1960, pág. 195.

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

DASDÔ_RES NOSSAS



Amanheceu cinza. Nem um raiozinho sequer de sol. Talvez de madrugada o céu traduziu a cor que me encontrava e produziu – solidário - esse novo dia. Numa conversa matinal falamos de dor e amor. Porque amor e dor são indissociáveis. Entre os seres que amamos, quais são os que consideramos insubstituíveis e cuja perda provoca dor? Quem é esse outro eleito, que faz com que eu seja o que sou, e sem o qual eu não seria mais a mesma? Com que fio é tecido o laço amoroso para que sua ruptura seja vivida como uma perda? O que é perder o amado e sofrer a dor de amar? Tantas questões não é Denise?! Só sabe o que é a dor aquele que a está sentindo, no presente. Passada ela fica na memória. Passa a morar no passado. A dor só consegue ser apreendida e apaziguada quando a ela se atribui valor simbólico. Atribuir sentido à dor, portanto, não seria absolutamente propor uma interpretação forçada para sua causa, nem mesmo consolar o sofredor, e menos ainda encorajá-lo a atravessar sua dor como experiência formadora que fortaleceria o caráter. Não, atribuir um sentido à dor, significa fazer um acordo, tentar vibrar com ela e, nesse estado de ressonância, esperar que o tempo e as palavras a dissipem. Ontem fui dor.  Hoje o dia amanheceu ensolarado... Cheio de cor. Bem-vindo!