Não importa onde estamos, numa mesa de bar ou no divã do analista, nossa mente nunca para e nossos medos e desejos nunca nos abandonam. Nem por um instante nos separamos do que realmente somos e, por mais difícil que seja, não controlamos cem por cento nossas atitudes. Se Freud, após 40 anos de estudo da mente humana, continuou com várias dúvidas sobre o ser humano, quem sou eu ou você para julgar as “crises histéricas” da melhor amiga? Só Freud explica!?!
Coisas simples que todos vivemos,pensamos,sentimos e nem sempre conseguimos partilhar. Assuntos, temas, extraídos da minha experiência clínica e do meu cotidiano. Em alguns você pensará: tô fora... Em outros: tô dentro...

segunda-feira, 20 de maio de 2013

(H)A(H) VIDA EM UMA FESTA!





Nesse final de semana aconteceu a XXII Festa de Israel na rua. Acredito que de todas as vinte e duas edições devo ter faltado a poucas. Só mesmo se não estou na cidade deixo de ir. É uma oportunidade ímpar de rever amigos, se deliciar com as comidas típicas, música, danças, show de humor e claro, muita prosa sem pressa de terminar. Vocês poderiam acreditar que é sempre a mesma coisa. Repetições – neuróticas - que perderiam a graça da novidade de uma primeira vez. A compulsão à repetição, que muitos chamam de “neurose de destino”, é sem dúvida, um fenômeno intrigante! Seus padrões desagradáveis parecem regidos por uma força incoercível, e eles sempre nos surpreendem por seus desfechos tanto esquisitos como inevitáveis. A mesmice é a verdadeira face da repetição.  É o que não ocorre nessas festas, posso lhes assegurar. Dois fatos absolutamente novos para mim dessa vez: degustar um shnitzel feito pela moçada do Dror e adquirir o Livro Neurótico de Receitas (2ª edição/Ophicina de arte & prosa). O shnitzel é um sanduiche feito com pão de sal fresquinho, pasta de grão bico e peito de frango frito com gergelim. Simples e delicioso assim. O livro é de autoria da Ana Cecília Carvalho, psicanalista fantástica, mestre em Psicologia, Doutora em literatura comparada, professora aposentada da UFMG - desde 2009 - e cozinheira de mão cheia.
A capa - um cérebro feito de um emaranhado de fios de macarrão - o título e a orelha, escrita por Renato Mezan chamou minha atenção: São cinquenta capítulos – alusão ao tempo usual das sessões – cujos títulos se relacionam com as ocasiões nas quais figurou o prato em questão: o “Salmão Narcisista”, feito para restaurar o amor-próprio da sua filha; a “Torta Reparativa de Maçã”, oferecida a um amigo enciumado; a “Truta Contrafóbica”, presenteada por uma paciente ao concluir o tratamento, e assim por diante. Logo após a crônica Ana nos brinda com a receita passo-a-passo. Já estou no capítulo 30... Frango do Suposto Saber: “Acho que meu analista fica calado nas sessões porque ele quer me fazer pensar que sabe alguma coisa sobre mim que eu desconheço. Mas, na verdade, ele não sabe nada. (Diz um amigo da filha num almoço de domingo) Ao ouvir isso minha filha exclama: Você não precisa mais de análise! E, em seguida, ela se volta para mim e pergunta, provocativa: Como analista, o que você acha? Não respondo. Reenviados ao próprio desejo, todos continuam a comer.”
Fica a dica para os apreciadores da boa mesa, leitura e cozinheiros em busca de novidades. Até 2014 Festa de Israel. Com o prazer dessa “compulsão à repetição!”.
Barraca do tradicional Falafel
A moçada do Dror e o seu Shnitzel
Artesanato típico

As crianças, de todas as idades, aproveitam os brinquedos 0800
"Descansando" ao lado do filhote
Vista geral com duas queridas que sempre prestigiam!

terça-feira, 14 de maio de 2013

TRASEIRA DIFERENTE




Tenho algum vizinho de rua que é caminhoneiro. Nas horas mais impróprias – para meu sono restabelecedor da beleza perdida – ele estaciona seu possante ou esquenta o motor para cair nessas estradas, nada maravilhosas, desse país gigantesco. Ou chega à calada da alta madrugada ou sai antes do galo dar seus primeiros acordes. O danado do caminhão faz um barulhão, dispensando qualquer tipo de despertador. Aliás, um não! São muitos até se aquietar por completo. Ontem, pela primeira vez, vesti meu penhoar (alguém aí ainda usa?) longo e desci. Seu Adair, porteiro noturno, quase teve um piripaque diante daquela aparição: cara mais amarrotada do que nota de dez em bolso de pinguço, cabelos desgrenhados, e um óculos de lentes grossas, as quatro da matina em plena portaria. Ô dó do moço... senti depois.  Aconteceu alguma coisa DonRegina? Perguntou-me o pobre, que mal continha o desejo de cair na risada sob sua metade assustada. Vem comigo lá fora! Quero conhecer esse caminhoneiro-despertador duma figa, pedi (?) braba que só.
Rua deserta. Graças a todos os santos! Bem depois que fui pensar nessa cena grotesca. De verdade? Você conhece alguma mulher que levante linda, maquiada e penteada, camisola longa, de-co-ta-da, esvoaçante e penhoar combinando? Vejo somente nas novelas com suas atrizes irrepreensíveis. Nem um fiozinho sequer fora do devido lugar! Então, podem imaginar o "looking" dessa que vos escreve. Voltando à rua deserta... Só Seu Adair e eu, de penhoar velhinho, descendo alguns metros de ladeira para ficar bem de pertinho com o caminhão e seu proprietário. O dono escafedeu-se pelas brumas do bairro. Para mim, para meu espanto, e do meu fiel escudeiro de aventuras, sobrou essa frase no vidro traseiro (ainda voltei pra pegar papel e caneta e copiar): “Não é possível conceber coisa alguma no mundo, ou mesmo fora do mundo, que sem restrição possa ser considerada boa, a não ser uma só: a boa vontade”!
Quem escolhe uma frase dessas para enfeitar seu ganha-pão só pode ser mesmo um sujeito muito gente fina. Fui dormir com essa e nem vou me importar mais em ser acordada. Usarei de minha boa-vontade sem moderação com o tal caminhoneiro.
Que diferença, né?! Apesar de ser beeem verdadeira.
(Imagens: internet)

quinta-feira, 9 de maio de 2013

MÃE




Então nesse próximo domingo é dia das mães. A segunda data, depois do natal, ansiada pelos comerciantes. Eu, que nunca fui fã de dias de, não me importava, nem um cadiquim, de sair pelo comércio da cidade em busca de mais um presente especial para minha Pãe. Gostava de viver aquela confusão entre as seis filhas de D.Lucy decidindo como e onde passaríamos. Eram sugestões das mais variadas e cada uma tentando valer a sua. No final dava tudo certo: filhas, genros, netos e bisnetos reunidos numa mesa onde a alegria imperava e D.Lucy reinava absoluta. Ela tinha um gosto nesses encontros que sempre nos lembrava, temerosa, que com sua ausência isso deixasse de acontecer. Não mãe! Nesses quatro anos, de saudades diárias, seu legado continua a se reunir para além de dias de. Só não lhe asseguro que algumas lágrimas-saudades não rolem. Mas sei que, de onde está, você as recolhe transformando-as em doces. A doçura de quem sempre soube celebrar a vida. A todas as mães, que pariram ou não, meu carinho e amor para além desse dia! A vocês que ainda as tem ao seu lado um pedido: dê-lhes um beijinho dizendo que é meu! Isso é um abusar consentido de mãe alheia... E vocês, generosas, permitirão.  Compartilho ainda, abaixo, um texto que “resume” bem essa nossa função. FELIZ DIA(s) PARA VOCÊ(s)!    

“Mãe é aquele ser estranho, louco, capaz de heroísmos, dramas e breguices com a mesma fúria.
Mãe faz escândalo, tira satisfação com professor, berra em público, dá vexame, deixa a gente sem graça, compra briga; é espaçosa, barulhenta, tendenciosa, leoa, tiete, dona da gente. Mãe desperta extremos, ganas, irrita, enlouquece, mas... é mãe.
Mãe faz promessa, prestação, hora extra pra que a gente tenha o que é preciso e o que sonha.
Paga mico: escreve carta para Papai Noel, se faz passar por fadinha do dente, coelho da páscoa, cuca.
 Pede autógrafo para artistas deploráveis, assiste a programas, peças, shows horríveis, revê milhares d e vezes os mesmos desenhos animados, conta as mesmas histórias centenas de vezes, vai pra Disney e A D O R A!
Mãe surta, passa dos limites, às vezes até bate, diz coisas duras; mãe pede desculpas, mortificada...
Mãe é um bicho doido, louco pela cria.
Mãe é visceral!
Mãe chora em apresentação de balé, em competição de natação, quando o filho namora pela 1a. vez, quando dá o primeiro beijo, quando vê o filho apaixonado no casamento, no parto...
Xinga todo e cada desgraçado que faz o filho sofrer, enlouquece esperando ele chegar da balada, arranca os cabelos diante da morte...
Mãe é uma espécie esquisita que se alterna entre fada e bruxa com uma naturalidade espantosa.
É competente no item culpa e insuperável no item ternura, mas pode ser virulenta, tem um lado B às vezes C, D, E...
Mãe é melosa, excessiva, obsessiva, repulsiva, comovente, histérica, mas não se é feliz sem uma.
Mãe é contrato: irrevogável, vitalício, intransferível!
Mãe lê pensamento, tem premonição, sonhos estranhos. Conhece cara de choro, de gripe, de medo; entra sem bater, liga de madrugada, pede favor chato, palpita e implica com amigos, namorados, escolhas.
Mãe dá a roupa do corpo, tempo, dinheiro, conselho, cuidado, proteção.
Mãe dá um jeito, dá nó, dá bronca, dá força.
Mãe cura cólica, porre, tristeza, pânico noturno, medos. Espanta monstros, pesadelos, bactérias, mosquitos, perigos.
Mãe tem intuição e é messiânica: mãe salva. Mãe guarda tesouros, conta histórias e tece lembranças.
Mãe é arquivo!
Mãe exagera, exaure, extrapola. Rumina o passado, remói dores, dá o troco, adora uma cobrança e um perdão lacrimoso.
Mãe abriga, afaga, alisa, lambe, conhece as batidas do nosso coração, o toque dos nossos dedos, as cores do nosso olhar e ouve música quando a gente ri.
Mãe tem coração de mãe!
Mãe é pedra no caminho, é rumo; é pedra no sapato, é rocha; é drama mexicano, tragédia grega e comédia italiana; é o maior dos clássicos; é colo, cadeira de balanço e divã de terapeuta...
Mãe é madona-mia! É deus-me-acuda; é graças-a-deus; é mãezinha-do-céu e é a mãe, é minha, e-eu-mato – quando-quiser; é a que padece no paraíso enquanto nos inferniza...
Mãe é absurda e inexoravelmente para sempre e é uma só: não há mistério maior! Só cabe uma mãe na vida de uma filha (o)... e olhe lá! Às vezes, nem cabe inteira.
Mãe é imensurável!
Mãe é saudade instalada desde o instante em que descobrimos a morte.
Mãe é eterna, não morre jamais. Bicho estranho, entranha, milagre, façanha, matriz, alma, carne viva, laço de sangue, flor da pele.
Mãe é mãe, e faz cada coisa..." (Texto de Hilda Lucas)

domingo, 5 de maio de 2013

"ETERNA APRENDIZ"


O calendário mudou. Já é maio de manhãs esplendorosas. Percebi a transformação diária de um cotidiano que insiste nesse olhar. Novidade(s) instantânea(s). A vida do homem enquanto parte também se materializa em relações. Viver é relacionar-se. É estar em relação. Por isso a vida de qualquer um de nós não pode ser analisada pelo que supostamente somos, mas pelo que acontece conosco no mundo. Na medida em que somos efeito do mundo com o qual nos relacionamos. Como, a cada instante, o mundo se relaciona com o nosso corpo, age sobre ele ininterruptamente. Produzindo sobre ele efeitos. Por isso, também para nós, viver em relação é viver em transformação contínua!
Dessa forma, a vida pode ser alegoricamente comparada a uma trajetória de encontros com o mundo. Isso porque, enquanto houver algum vivente, haverá mundo para se relacionar com ele. Inferimos daí duas coisas: a primeira é que o mundo não para de nos afetar. A segunda é que não paramos de afetar o mundo. Diariamente e nesse cotidiano que (re)clama pela singularidade do nosso olhar. Mas nem sempre nos damos conta do mundo que nos afeta. Tampouco do afeto. Do efeito que o mundo determina em nós. Por isso, muitas vezes não percebemos a oscilação de potência de agir que o mundo determina sobre nosso corpo ao se relacionar com ele. Assim, não raro, um encontro nos apequena; e passa batido. E também acontece de alguma coisa - que se apresenta inesperadamente diante de nós - alavancar inesperadamente nossa potência; e também não atinarmos. Talvez, se a gente aumentar a capacidade de nos darmos conta de como o mundo nos afeta, poderíamos entender melhor nossas relações, reações, nossa vida em suma. E dar menos bola para explicações fundadas em outros mundos. PARE-OLHE-ESCUTE e SIGA nessa viagem de viver a vida. É o sinal. Simples assim!