Não importa onde estamos, numa mesa de bar ou no divã do analista, nossa mente nunca para e nossos medos e desejos nunca nos abandonam. Nem por um instante nos separamos do que realmente somos e, por mais difícil que seja, não controlamos cem por cento nossas atitudes. Se Freud, após 40 anos de estudo da mente humana, continuou com várias dúvidas sobre o ser humano, quem sou eu ou você para julgar as “crises histéricas” da melhor amiga? Só Freud explica!?!
Coisas simples que todos vivemos,pensamos,sentimos e nem sempre conseguimos partilhar. Assuntos, temas, extraídos da minha experiência clínica e do meu cotidiano. Em alguns você pensará: tô fora... Em outros: tô dentro...

domingo, 25 de outubro de 2009

AGUA-BENTA PRÁ UNS, MARVADA PRÁ OUTROS



“Passaram-se semanas. Jerônimo tomava agora, todas as manhãs, uma xícara de café bem grosso, à moda da Ritinha, e tragava dois dedos de parati ‘pra cortar a friagem’. Uma transformação, lenta e profunda, operava-se nele, dia a dia, hora a hora, reviscerando-lhe o corpo e alando-lhe os sentidos, num trabalho misterioso e surdo de crisálida. A sua energia afrouxava lentamente: fazia-se contemplativo e amoroso... esquecia-se dos seus primitivos sonhos de ambição, para idealizar felicidades novas, picantes e violentas; tornava-se liberal, imprevidente e franco...”

O trecho é do livro “O cortiço”, clássico do naturalismo publicado pela primeira vez em 1890, quando o autor Aluísio Azevedo identificava na ‘parati’ um dos agentes de brasilidade – estado que tomou conta do imigrante português da história e que tem outros sintomas, como a infindável imaginação para dar nomes às coisas. No caso da aguardente de cana, de acordo com a sagacidade da região, ela pode atender pelos incompatíveis água-benta e água-de-briga; os psicanalíticos amansa-corno e meu consolo; os sinceros arrebenta-peito, engasga-gato, mato-bicho e quebra-goela; o simplesmente boa e o mais humilde boinha; os dissimulados dengosa, lindinha e sinhazinha; os assumidos danada, marvada e teimosa; os engajados esquenta-por-dentro e quebra-gelo; os indecifráveis assovio-de-cobra e sete-virtudes; ou o profético tome-juízo.

Mas, seja qual for o apelido, nenhum deles esconde o perigo da cachaça; e é sempre bom manter a moderação. Ou então, como o mesmo Aluísio Azevedo escreveu, algumas páginas adiante, “O cortiço acordava com o remancho das segundas-feiras; ouviam-se os pigarros das ressacas de parati.”

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